O importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós mesmos fazemos do que os outros fizeram de nós.
JEAN-PAUL SARTRE

domingo, 28 de abril de 2013

ELIZABETH BISHOP




A arte de perder

A arte de perder não é nenhum mistério;
Tantas coisas contêm em si o acidente
De perdê-las, que perder não é nada sério.

Perca um pouquinho a cada dia. Aceite, austero,
A chave perdida, a hora gasta bestamente.
A arte de perder não é nenhum mistério.

Depois perca mais rápido, com mais critério:
Lugares, nomes, a escala subsequente
Da viagem não feita. Nada disso é sério.

Perdi o relógio de mãe. Ah! E nem quero
Lembrar a perda de três casas excelentes.
A arte de perder não é nenhum mistério.

Perdi duas cidades lindas. E um império
Que era meu, dois rios, e mais um continente.
Tenho saudade deles. Mas não é nada sério.

– Mesmo perder você (a voz, o riso etéreo
que eu amo) não muda nada. Pois é evidente
que a arte de perder não chega a ser mistério
por muito que pareça (Escreve!) muito sério.

(tradução de Paulo Henriques Britto)

quinta-feira, 18 de abril de 2013

PRÉMIO AMADEO DE SOUZA-CARDOSO


Amadeo de Souza-Cardoso ( 1887 – 1918) foi um pintor, que morreu cedo, quando ainda tinha tanto a dar.
Amadeo de Souza-Cardoso destacou-se entre a primeira geração de pintores modernistas, pela qualidade excecional da sua obra e pelo diálogo que estabeleceu com as vanguardas históricas do início do século XX. "O artista desenvolveu, entre Paris e Manhufe, a mais séria possibilidade de arte moderna em Portugal num diálogo internacional, intenso, com os artistas do seu tempo". A sua pintura articula-se de modo aberto com movimentos como o cubismo o futurismo ou o expressionismo, atingindo em muitos momentos – e de modo sustentado na produção dos últimos anos –, um nível em tudo equiparável à produção de topo da arte internacional sua contemporânea.

[Na 9ª.Edição do Prémio Amadeo de Souza-Cardoso, vai ser atribuído o prémio consagração a Paula Rego]



segunda-feira, 15 de abril de 2013

MARCEL DUCHAMP


MARCEL DUCHAMP, artista conceptual e teórico, considerado «maître à penser», de toda uma série de escolas estéticas de vanguarda. Sucessivamente cubista, dadaísta e surrealista, deixou uma obra escassa e esotérica.
Considerava-se um anti-artista, em rutura com a escola tradicional. Era um filósofo, o sentido das ideias correspondia à expressão artística do homem – como origem da concepção da arte.
Sua obra que era vista por elitista por alguns, é democrata e popular. Duchamp demonstrou que todos somos criadores se o desejarmos e se soubermos renovar constantemente o «olhar» sobre o Mundo que nos rodeia.
A criação existe em todo o homem. O contributo da criatividade é um direito a que todo o homem deve ter acesso, mas deve ter sempre por objectivo o outro.
De Duchamp é muito conhecida a sua obra «Nu descendant l’escalier» (Uma análise cronofotográfica, mutação sucessiva e simultânea do movimento), mas principalmente os seus «ready-made» (criação ocasional em fuga do «acaso»), elevando um objecto comum à qualidade de arte e o mais conhecido é sem dúvida «La Fontaine», um urinol invertido e colocado num pedestal. É uma forma de contestar tudo que na arte é motivado por anos de formação tradicional.
Um outro interesse de Duchamp foi o erotismo, Rrose Sélavy, foi o nome que escolheu, numa pretensa mudança de sexo, para compreender a dualidade do homem e da mulher.
Duchamp com o seu sorriso quase diabólico, parecia dizer: «Atenção, as coisas sempre que apresentadas, não serão aquilo que se julga que sejam. Caberá a cada um a decisão de o determinar».
O fotógrafo Man Ray foi seu amigo de experiências!





segunda-feira, 1 de abril de 2013

RUA DE NENHURES


PEDRO TAMEN, lançou o seu 20º título «RUA DE NENHURES», Editora D. Quixote.
Um livro temático, como muitos outros que publicou.

De «RUA DE NENHURES»

Ardes-me no peito onde a custo
o meu amor perpassa, e vai até
às loucuras do corpo
e às agruras da alma.
Ardes-me no minuto, no segundo,
na hora amaciada por olhos entrevistos,
ardes-me no sangue obstruído
e na certeza muda que me diz
que o coração existe.


De cabelo crestado pela língua de fogo,
queimado segui pelo caminho
com as pústulas antigas, renovadas
na ciência que tinha agora delas.
Segui pelo caminho até ao monte crânio,
com as costas vergadas a tal peso
que a morte prometida me entregou.
E o meu único alívio, tuas mãos,
tuas mãos, meu sudário,

+++

Corro, feito merda, para os braços
teus, inexistentes, são-não-são,
pisco os olhos segados mas não cegos,
estremolhado de um sono sonegado,
abano abananado, meço-me, estremeço-me
( não é meu este fato, pesa, é do adelo),
será que ainda corro, ou morro, isto que é,
que nave me trabsporta, e a que porta?

E no baloiç’oiço a musa infusa,
acordo enfim plantado onde não estou.

Pedro Tamen. 64 poemas de um «não lugar».