O importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós mesmos fazemos do que os outros fizeram de nós.
JEAN-PAUL SARTRE

domingo, 31 de janeiro de 2010

PAUL GAUGUIN (1848-1903)

A sua obra, longe de poder ser enquadrada em algum movimento, foi tão singular como as de Van Gogh ou Paul Cézanne. Apesar disso, é verdade que teve seguidores e que pode ser considerado o fundador do grupo Les Nabis, que, mais do que um conceito artístico, representava uma forma de pensar a pintura como filosofia de vida.
As suas primeiras obras tentavam captar a simplicidade da vida no campo, algo que ele conseguiu com a aplicação arbitrária das cores, em oposição a qualquer naturalismo, como demonstra o seu famoso CRISTO AMARELO.


O pintor, buscando o exotismo partiu para o Taiti, em busca de novos temas, para se libertar dos condicionamentos da Europa. As suas telas surgem carregadas da iconografia exótica do lugar, e não faltam cenas que mostram um erotismo natural. A cor adquire mais preponderância representada pelos vermelhos intensos, amarelos, verdes e violetas, como MULHER COM UMA FLOR.

"DE ONDE VIEMOS? O QUE SOMOS? PARA ONDE VAMOS?, é uma tela enorme que sintetiza toda sua pintura. É também um dos quadros que mais me faz reflectir. Nele estão representadas todas as idades e o seu título é paradigma de grandes inquietações

Gauguin desenvolveu as técnicas do "sintetismo" e "cloisonnisme", estilos de representação simbólica da natureza onde são utilizadas formas simplificadas e grandes campos de cores vivas chapadas, que ele fechava com uma linha negra, e que mostravam uma forte influência das gravuras japonesas.
A sua pintura é caracterizada por:
Natureza alegórica, decorativa e sugestiva;
Formas dimensionais, estilizadas, sintéticas e estáticas.

sábado, 30 de janeiro de 2010

FRED ASTAIRE - O GRANDE BAILARINO



MORREU J.D.SALINGER (1919-2010)


O escritor americano J. D. Salinger morreu com 91 anos. Notabilizou-se pela sua obra de culto, The Catcher in the Rye, mas também por se ter negado à fama. Viveu isolado de honrarias na sua casa do New Hampshire até ao fim.
A morte do escritor foi anunciada pelos seus representantes literários, a Harold Ober Associates. Vivia em total isolamento há mais de 50 anos.
Salinger publicou apenas quatro obras. Além de Uma Agulha no Palheiro (1951), Nove Contos (1953), Franny e Zooey (1961), Carpinteiros, Levantai Alto o Pau de Fileira e Seymour: (Uma Introdução) (1963). Escreveu ainda vários contos que nunca foram editados em livro, alguns dos quais na The New Yorker. Desde 1965 que não publicava nada.
Uma Agulha no Palheiro tem como (anti-) herói o jovem Holden Caulfield, expulso do colégio caro que frequenta e que expressa o seu desprezo pelo mundo "falso" dos adultos de forma singular, enquanto vagueia por Nova Iorque. Através de Holden, J. D. Salinger expressou as suas próprias angústias.Tal como a personagem, o escritor também foi um menino problemático, tendo sido expulso de várias escolas.
O livro virou best-seller imediato e "bíblia" do mal-estar juvenil, chegando a ser proibido em bibliotecas públicas e escolas nos EUA, e leitura recomendada noutras. Mark David Chapman, que assassinou John Lennon em 1980, levava este livro debaixo do braço.
É uma obra-chave da literatura americana do pós-guerra. Nomes como Philip Roth, John Updike ou Harold Brodkey disseram ter uma dívida literária para com Salinger.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Os Cadernos de Malte Laurids Brigge", Rainer Maria Rilke

Único romance do poeta Rainer Maria Rilke, um dos grandes nomes da literatura alemã do século XX. Escrito no período em que o autor se mudou para Paris, a fim de redigir um trabalho sobre o amigo e escultor Auguste Rodin, Os cadernos de Malte Laurids Brigge, reflectem algumas das experiências de Rilke na capital francesa e o contacto que travou com os artistas modernistas da época.
Ao deixar para trás a família e as lembranças da infância vivida num castelo no campo, o jovem dinamarquês Malte Laurids Brigge, depara-se com uma Paris ao mesmo tempo fascinante e inóspita. Os cadernos fazem anotações das dificuldades sentidas pelo personagem, as mesmas do autor.
Influenciado por Nietzsche e Kierkegaard, o livro, publicado em 1910, expõe o processo de desenvolvimento de Malte Laurids Brigge, tanto psicológico quanto físico, fazendo vários questionamentos, sobre a busca da individualidade, a tentativa de entender o significado da morte e o questionamento da religião são algumas das angústias do personagem e do próprio autor.


“Há muitas pessoas, mas há ainda muitas mais caras, pois cada uma tem várias. Há pessoas que usam uma cara anos seguidos; gasta-se naturalmente, suja-se, quebra nas rugas, alarga como as luvas que se usaram em viagem. São as pessoas simples, poupadas; não mudam de cara, nem a mandam lavar. Serve muito bem, afirmam elas; e quem é que lhes pode provar o contrário? (…) Outras pessoas põem as suas caras com uma rapidez medonha, uma após outra, e gastam-nas. Parece-lhes a princípio que lhes chegam para sempre, mas, mal chegam a quarenta – eis a última. Isto tem naturalmente o seu trágico. Não estão habituadas a poupar caras; a última gastou-se ao cabo de oito dias, tem buracos, está em vários sítios delida e fina como papel, e, a pouco e pouco, vai aparecendo a pasta de baixo, a não-cara, e é com essa que andam”.


“Antigamente sabia-se (ou talvez se pressentisse) que se trazia a morte dentro de si, como o fruto o caroço. As crianças tinham dentro uma pequena e os adultos uma grande. As mulheres tinham-na no seio e os homens no peito. Tinha-se, a morte, e isto dava às pessoas uma dignidade particular e um calmo orgulho”.

“O destino gosta de inventar desenhos e figuras. A dificuldade dele reside no complicado. A vida mesma, porém, é difícil pela simplicidade. Tem apenas algumas coisas de um tamanho que nos não é adequado. O santo, rejeitando o destino, escolhe estas coisas, em face de Deus. Mas que a mulher, conforme à sua natureza, tenha de fazer a mesma escolha em relação ao homem, é o que evoca a fatalidade de todas as relações de amor: resoluta e sem destino como uma eterna, ergue-se ela ao lado dele, dele que se transforma. Sempre a amante ultrapassa o amado, porque a vida é maior do que o destino. O dom de si mesma quer ser desmedido: é esta a sua ventura. A dor inominada do seu amor, porém, foi sempre esta: que se exija dela que limite este dom de si mesma”.

(Rilke, “Os Cadernos de Malte Laurids Brigge”, tradução de Paulo Quintela, edição de “O Oiro do Dia”, Porto, 1983)

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

A SERENIDADE DE MILLET...

Jean-François Millet (1814 – 1875) Pintor romântico e um dos fundadores da Escola de Barbizon. É conhecido como percursor do realismo, pelas suas representações de trabalhadores rurais.

As obras de MILLET, foram consideradas sentimentais para alguns, exageradamente piegas para outros, mas a verdade é que as suas obras em nenhum momento suscitaram indiferença. Na tepidez dos seus ocres e marrons, no lirismo da sua luz, na magnificência e dignidade das suas figuras humanas, o pintor manifestava a integração do homem com a natureza. Com simplicidade e sentimentalismo mostra afecto e respeito, pelo mundo rural. Exemplo disso é sua famosa tela Angelus, (Louvre).



terça-feira, 26 de janeiro de 2010

POEMAS DE SOFHIA



PORQUE


Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão.
Porque os outros têm medo mas tu não.
Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.
Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.
Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.


AS PESSOAS SENSÍVEIS


As pessoas sensíveis não são capazes
De matar galinhas
Porém são capazes
De comer galinhas
O dinheiro cheira a pobre e cheira
À roupa do seu corpo
Aquela roupa
Que depois da chuva secou sobre o corpo
Porque não tinham outra
O dinheiro cheira a pobre e cheira
A roupa
Que depois do suor não foi lavada
Porque não tinham outra
"Ganharás o pão com o suor do teu rosto"
Assim nos foi imposto
E não:
"Com o suor dos outros ganharás o pão."
Ó vendilhões do templo
Ó constructores
Das grandes estátuas balofas e pesadas
Ó cheios de devoção e de proveito
Perdoai-lhes Senhor
Porque eles sabem o que fazem.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

SE ISTO É UM HOMEM - PRIMO LEVI


Num sábado, dia 11 de Abril de 1987, por volta das 10 horas da manhã, a porteira de um sólido edifício cinzento do século XIX situado no Corso Rei Umberto de Turim tocou à porta do 3º andar para, como todos os dias, entregar o correio. Primo Levi abriu-lhe a porta, sorriu, recebeu o correio, agradeceu e reentrou. Poucos minutos depois o seu corpo estatelava-se no fundo da escada, ao lado do elevador. Morreu instantaneamente, como revelou a autópsia, que não detectou no seu corpo qualquer sinal de violência, biografias mais recentes afirmam ter-se tratado de um acidente, provocado pela medicação que Levi tomava na altura.Podia ter sido suicídio, na realidade, depois da sobrevivência a Auschwitz, a memória tornara-se-lhe insuportável.

Em 1962, Levi tinha escrito: Há um sonho pleno de horror que não deixa de me visitar (...). É um sonho dentro de um sonho. Varia nos detalhes mas não na substância. Posso estar sentado à volta de uma mesa com a minha família ou com amigos, ou no trabalho, ou num campo verde. Em suma, num ambiente pacífico e descontraído, sem qualquer tensão ou aflição aparente; e, no entanto, sinto uma profunda e subtil angústia, a sensação definitiva de uma ameaça pendente. E, de facto, à medida que o sonho continua, devagar ou brutalmente, de cada vez de uma forma diferente, tudo se desintegra à minha volta, o cenário, as paredes, as pessoas, enquanto a angústia se torna cada vez mais intensa e mais definida. Agora, tudo se transforma em caos. Estou sozinho no centro de um nada cinzento e perturbador e agora sei o que significam as coisas e também sei que sempre o soube. Estou no Laager e nada é verdadeiro fora do Laager. Tudo o resto era uma breve pausa, uma ilusão dos sentidos, um sonho (...). Este sonho dentro do sonho terminou e o outro sonho continua, gélido. Uma voz bem conhecida pronuncia uma única palavra, que não é imperiosa, apenas breve. É a voz de comando do amanhecer de Auschwitz, uma palavra estrangeira, temida, esperada: "Wstawách!. Levanta-te.

SE ISTO É UM HOMEM - A obra imortal de Primo Levi, um judeu italiano que sobreviveu a Auschwitz, para escrever o mais humano e comovente testemunho do Holocausto.



domingo, 24 de janeiro de 2010

DOROTHEA LANGE (1895-1965)

Esta fotografa americana, nos anos 1930, ao serviço da Farm Security Administration, percorreu vinte e dois estados do Sul e Oeste dos Estados Unidos, recolhendo imagens que documentam o impacto da Grande Depressão na vida dos camponeses.
Lange é a autora da fotografia "Mãe Emigrante", de 1936. Trata-se da mais famosa fotografia saída da FSA e uma das mais reproduzidas da história da fotografia, tendo aparecido em mais de dez mil publicações.







sábado, 23 de janeiro de 2010

ESPERANÇA - RICARDO REIS


Quero ignorado, e calmo
Por ignorado, e próprio
Por calmo, encher meus dias
De não querer mais deles.

Aos que a riqueza toca
O ouro irrita a pele.
Aos que a fama bafeja
Embacia-se a vida.

Aos que a felicidade
É sol, virá a noite.
Mas ao que nada espera
Tudo que vem é grato.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

EDWARD HOPPER (1882 — 1967)



Realista imaginativo, este artista retratou com subjectividade a solidão urbana e a estagnação do homem causando ao observador um impacto psicológico. A obra de Hopper sofreu forte influência dos estudos psicológicos de Freud e da teoria intuicionista de Bergson, que buscavam uma compreensão subjectiva do homem e dos seus problemas. O tema das pinturas de Hopper são as paisagens urbanas, porém, desertas, melancólicas e iluminadas por uma luz estranha. Arte individualista. Expressão de solidão, vazio, desolação e estagnação da vida humana, expresso pelas figuras anónimas que jamais se comunicam. Pinturas que evocam silêncio, reserva, com um tratamento suave, exercendo frequentemente forte impacto psicológico. Semelhança com a pintura metafísica.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

HENRI CARTIER-BRESSON





Henri Cartier-Bresson (1908 – 2004) was a French photographer considered to be the father of modern photojournalism, an early adopter of 35 mm format, and the master of candid photography. He helped develop the "street photography». or "real life reportage" style that has influenced generations of photographers that followed.








segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

ALEXANDER SEARCH

Alexander Search é um dos heterónimos, de Fernando Pessoa, criado em 1899, quando Pessoa ainda era um estudante. Com este nome, o poeta escrevia cartas a si mesmo além de poemas escritos em inglês.Os poemas escritos em inglês foram feitos num período em que Fernando Pessoa estava na África do Sul, com a mãe e o padrasto.



A MEU MAIOR AMIGO

Quando eu morrer, eu sei, tu escreverás
Triste soneto à morte prematura;
Dirás que a vida cansa em amargura
E, pálido e frio, tu me cantarás.

Nas quadras, reflectido se lerá
De como, vã e breve, a vida expira
E como em terra funda, dura e fria,
A vida, má ou boa, acabará.

A seguir, nos tercetos, tu dirás
Que a morte é mistério, tudo fugaz,
Verdadeira, talvez, a vida além.

Por fim porás a data, assinarás.
E, relido o soneto, ficarás
Contente por tê-lo escrito bem.


CANÇÃO DE FANNY

Vimos da onda, da costa
Em som arrebatador,
E da aragem que recosta
Numa nuvem seu langor;
Vimos do rio que murmura,
Da folhagem que sussurra,
Nós vimos alegremente.

Como os pingos do orvalho,
Brilhantes e numerosos
Nós descemos até Fanny
Como os dias luminosos;
Do alto cume do monte
E do cintilar da fonte,
Nós vimos alegremente.

Vimos do vale, da colina,
Da montanha, do valado;
Da tristeza da tardinha
Com tanto conto contado;
Do prado em sua doçura,
Da sombra em sua frescura,
Nós vimos alegremente.

Habitámos no salgueiro
E no ninho que acoberta,
Mas fizemos travesseiro
Do coração do poeta;
E de tudo o que repassa
As almas de amor e graça,
Nós vimos alegremente.



SOUVENIR

Como é doce e triste por vezes ouvir
Algum som antigo trazido à memória,
E ver, como em sonhos, algum rosto querido,
Trecho de paisagem, campo, rio ou vale,
Lembrança tão breve, triste e agradável,
Algo que recorde o tempo bom da infância.
Então em dor feliz as lágrimas brotam,
Esse choro subtil que na mente aguarda,
E tudo o já sentido - campo, rio e voz -
Toma outro alcance, na memória adornado,
E lento emerge em fantasiosa luz.
Mas, ai, eis que acordo p'los sonhos traído!
O que sinto e ouço apenas ilusão,
Porque o passado não pode regressar.
Estes campos não são os que eu conheci,
Os sons não são os que ouvi; tudo passou
E tudo o que é passado, ai, não volta mais.



Alexander Search
Poesia
edição e tradução
Luísa Freire
Assírio & Alvim
Obras de Fernando Pessoa
1999


«Aqui jaz quem julgou ser o melhor de todos os poetas deste vasto mundo.»


EPITÁFIO

Aqui jaz Alexander Search
Que Deus e os homens deixaram só,
Que sofreu e chorou ser escárnio da natureza.
Recusou o Estado, recusou a igreja,
Recusou Deus, a mulher, o homem e o amor,
Recusou a terra em volta e o céu além.
Resumiu assim o seu saber:
(...)e amor não há
Nada no mundo existe de sincero
Salvo a dor, o ódio, a luxúria e o medo
E mesmo estes são ainda suplantados
Pelos males que causam.
Andava pelos vinte anos quando morreu
Estas foram as suas últimas palavras:
Deus, a Natureza e o Homem, malditos sejam!

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

SIMBOLISMO

KLIMT - Kiss

MOREAU - Aparição

BÖCKIN - A Ilha dos Mortos

ENSOR - Chegada de Cristo a Bruxelas

MUNCH - O Grito

A minha atenção tem andado virada para o Movimento Simbolista/Decadentista. Tenho ostado alguma poesia de Baudelaire, Malharmé e há outros dois poetas que também tenho andado a reler, Baudelaire, Verlaine...Hoje coloco algumas pinturas que gosto, de alguns pintores simbolistas, também há quem se refira a esta pintura, como Pintura Fantástica.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

ANGÚSTIA - STÉPHANE MALLARMÉ

Angústia

Não vim domar teu corpo esta noite, ó cadela
Que encerras os pecados de um povo, ou cavar
Em teus cabelos torpes a triste procela
No incurável fastio em meu beijo a vazar:

Busco em teu leito o sono atroz sem devaneios
Pairando sob ignotas telas do remorso,
E que possas gozar após negros enleios,
Tu que acima do nada sabes mais que os mortos:

Pois o Vício, a roer minha nata nobreza,
Tal como a ti marcou-me de esterilidade,
Mas enquanto teu seio de pedra é cidade.

De um coração que crime algum fere com presas,
Pálido, fujo, nulo, envolto em meu sudário,
Com medo de morrer pois durmo solitário.

STÉPHANE MALLARMÉ


Stéphane Mallarmé, um poeta de inegável importância na nossa poesia. Pessoa leu atentamente Mallarmé, sublinhando alguns versos.

BRISA MARINHA

Tradução: Augusto de Campos

A carne é triste, sim, e eu li todos os livros.
Fugir! Fugir! Sinto que os pássaros são livres,
Ébrios de se entregar à espuma e aos céus imensos.
Nada, nem os jardins dentro do olhar suspensos,
Impede o coração de submergir no mar
Ó noites! nem a luz deserta a iluminar
Este papel vazio com seu branco anseio,
Nem a jovem mulher que preme o filho ao seio.
Eu partirei! Vapor a balouçar nas vagas,
Ergue a âncora em prol das mais estranhas plagas!
Um Tédio, desolado por cruéis silêncios,
Ainda crê no derradeiro adeus dos lenços!
E é possível que os mastros, entre ondas más,
Rompam-se ao vento sobre os náufragos,
sem mastros, sem mastros, nem ilhas férteis a vogar...
Mas, ó meu peito, ouve a canção que vem do mar!

BRISE MARINE

La chair est triste, hélas! et j´ai lu tous les
livres.Fuir! là-bas fuir ! Je sens que des oiseaux sont livres
D´être parmi l´écume inconnue et les cieux!

Rien, ni les vieux jardins reflétés par les yeux
Ne retriendra ce coeur qui dans la mer se trempe
O nuits ! ni la clarté déserte de ma lampe
Sur le vide papier que la blancheur défend
Et ni la jeune femme allaitant son enfant.
Je partirai ! Steamer balançant ta mâture,
Lève l´ancre pour une exotique nature!

Un Ennui, désolé par les cruels espoirs,
Croit encore à l´adieu suprême des mouchoirs!
Et, peut-être, les mâts, invitant les orages
Sont-ils de ceux qu´un vent penche sur les naufrages
Perdus, sans mâts, sans mâts, ni fertiles îlots...
Mais, ô mon coeur, entends le chant des matelots!

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

FOTOGRAFIAS DE SEBASTIÃO SALGADO






CHUVA OBLÍQUA - FERNANDO PESSOA

CHUVA OBLÍQUA
I

Atravessa esta paisagem o meu sonho dum porto infinito
E a cor das flores é transparente de as velas de grandes navios
Que largam do cais arrastando nas águas por sombra
Os vultos ao sol daquelas árvores antigas...
O porto que sonho é sombrio e pálido
E esta paisagem é cheia de sol deste lado...
Mas no meu espírito o sol deste dia é porto sombrio
E os navios que saem do porto são estas árvores ao sol...
Liberto em duplo, abandonei-me da paisagem abaixo...
O vulto do cais é a estrada nítida e calma
Que se levanta e se ergue como um muro,
E os navios passam por dentro dos troncos das árvores
Com uma horizontalidade vertical,
E deixam cair amarras na água pelas folhas uma a uma dentro...
Não sei quem me sonho...
Súbito toda a água do mar do porto é transparente
E vejo no fundo, como uma estampa enorme que lá estivesse
[desdobrada,
Esta paisagem toda, renque de árvores, estrada a arder em aquele
[porto,
E a sombra duma nau mais antiga que o porto que passa
Entre o meu sonho do porto e o meu ver esta paisagem
E chega ao pé de mim, e entra por mim dentro,
E passa para o outro lado da minha alma...
II
Ilumina-se a igreja por dentro da chuva deste dia,
E cada vela que se acende é mais chuva a bater na vidraça...
Alegra-me ouvir a chuva porque ela é o templo estar aceso,
E as vidraças da igreja vistas de fora são o som da chuva ouvido por
[dentro...
O esplendor do altar-mor é o eu não poder quase ver os montes
Através da chuva que é ouro tão solene na toalha do altar...
Soa o canto do coro, latino e vento a sacudir-me a vidraça
E sente-se chiar a água no facto de haver coro...
A missa é um automóvel que passa
Através dos fiéis que se ajoelham em hoje ser um dia triste...
Súbito vento sacode em esplendor maior
A festa da catedral e o ruído da chuva absorve tudo
Até só se ouvir a voz do padre água perder-se ao longe
Com o som de rodas de automóvel...
E apagam-se as luzes da igreja
Na chuva que cessa.
III
A Grande Esfinge do Egipto sonha pôr este papel dentro...
Escrevo - e ela aparece-me através da minha mão transparente
E ao canto do papel erguem-se as pirâmides...
Escrevo - perturbo-me de ver o bico da minha pena
Ser o perfil do rei Quéops...
De repente paro...
Escureceu tudo... Caio por um abismo feito de tempo...
Estou soterrado sob as pirâmides a escrever versos à luz clara deste
[candeeiro
E todo o Egipto me esmaga de alto através dos traços que faço com a
[pena...
Ouço a Esfinge rir por dentro
O som da minha pena a correr no papel...
Atravessa o eu não poder vê-la uma mão enorme,
Varre tudo para o canto do tecto que fica por detrás de mim,
E sobre o papel onde escrevo, entre ele e a pena que escreve
Jaz o cadáver do rei Quéops, olhando-me com olhos muito abertos,
E entre os nossos olhares que se cruzam corre o Nilo
E uma alegria de barcos embandeirados erra
Numa diagonal difusa
Entre mim e o que eu penso...
Funerais do rei Quéops em ouro velho e Mim!...
IV
Que pandeiretas o silêncio deste quarto!...
As paredes estão na Andaluzia...
Há danças sensuais no brilho fixo da luz...
De repente todo o espaço pára...,
Pára, escorrega, desembrulha-se...,
E num canto do tecto, muito mais longe do que ele está,
Abrem mãos brancas janelas secretas
E há ramos de violetas caindo
De haver uma noite de Primavera lá fora
Sobre o eu estar de olhos fechados...
V
Lá fora vai um redemoinho de sol os cavalos do carrossel...
Árvores, pedras, montes, bailam parados dentro de mim...
Noite absoluta na feira iluminada, luar no dia de sol lá fora,
E as luzes todas da feira fazem ruídos dos muros do quintal...
Ranchos de raparigas de bilha à cabeça
Que passam lá fora, cheias de estar sob o sol,
Cruzam-se com grandes grupos peganhentos de gente que anda na
[feira,
Gente toda misturada com as luzes das barracas, com a noite e com o
[luar,
E os dois grupos encontram-se e penetram-se
Até formarem só um que é os dois...
A feira e as luzes da feira e a gente que anda na feira,
E a noite que pega na feira e a levanta no ar,
Andam por cima das copas das árvores cheias de sol,
Andam visivelmente por baixo dos penedos que luzem ao sol,
Aparecem do outro lado das bilhas que as raparigas levam à cabeça,
E toda esta paisagem de Primavera é a lua sobre a feira,
E toda a feira com ruídos e luzes é o chão deste dia de sol...
De repente alguém sacode esta hora dupla como numa peneira
E, misturado, o pó das duas realidades cai
Sobre as minhas mãos cheias de desenhos de portos
Com grandes naus que se vão e não pensam em voltar...
Pó de oiro branco e negro sobre os meus dedos...
As minhas mãos são os passos daquela rapariga que abandona a feira,
Sozinha e contente como o dia de hoje...
VI
O maestro sacode a batuta,
E lânguida e triste a música rompe...
Lembra-me a minha infância, aquele dia
Em que eu brincava ao pé dum muro de quintal
Atirando-lhe com uma bola que tinha dum lado
O deslizar dum cão verde, e do outro lado
Um cavalo azul a correr um jockey amarelo...
Prossegue a música, e eis na minha infância
De repente entre mim e o maestro, muro branco,
Vai e vem a bola, ora um cão verde,
Ora um cavalo azul com um jockey amarelo...
Todo o teatro é o meu quintal, a minha infância
Está em todos os lugares, e a bola vem a tocar música,
Uma música triste e vaga que passeia no meu quintal
Vestida de cão verde tornando-se jockey amarelo...
(Tão rápida gira a bola entre mim e os músicos...)
Atiro-a de encontro à minha infância e ela
Atravessa o teatro todo que está aos meus pés
A brincar com um jockey amarelo e um cão verde
E um cavalo azul que aparece por cima do muro
Do meu quintal... E a música atira com bolas
À minha infância... E o muro do quintal é feito de gestos
De batuta e rotações confusas de cães verdes
E cavalos azuis e jockeys amarelos...
Todo o teatro é um muro branco de música
Por onde um cão verde corre atrás de minha saudade
Da minha infância, cavalo azul com um jockey amarelo...
E dum lado para o outro, da direita para a esquerda,
Donde há árvores e entre os ramos ao pé da copa
Com orquestras a tocar música,
Para onde há filas de bolas na loja onde a comprei
E o homem da loja sorri entre as memórias da minha infância...
E a música cessa como um muro que desaba,
A bola rola pelo despenhadeiro dos meus sonhos interrompidos,
E do alto dum cavalo azul, o maestro, jockey amarelo tornando-se
[preto,
Agradece, pousando a batuta em cima da fuga dum muro,
E curva-se, sorrindo, com uma bola branca em cima da cabeça,
Bola branca que lhe desaparece pelas costas abaixo...
8-3-1914

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

ÉDOUARD MANET

Édouard Manet (1832 — 1883), os seus quadros são jogos de luz e de sombra, restituindo ao nu a sua crueza e a sua verdade, muito diferente dos nus adocicados da época. O trabalhado das texturas é apenas sugerido, as formas, simplificadas. Os temas deixaram de ser impessoais ou alegóricos, passando a traduzir a vida da época, e, em certos quadros, seguiam a estética naturalista de Zola e Maupassant.
Manet era criticado não apenas pelos temas, mas também por sua técnica, que escapava às convenções académicas. Frequentemente inspirado pelos mestres clássicos e em particular pelos espanhóis do Século de Ouro, Manet influenciou, entretanto, certos precursores do impressionismo, devido à pureza da sua abordagem. Por esta sua marginalização
das associações literárias tradicionais ou moralistas, é considerado um dos fundadores da arte moderna. Suas principais obras foram: Almoço na relva ou Almoço no Campo, Olímpia, A sacada, O tocador de pífaro e A execução de Maximiliano.



OLYMPIA
ALMOÇO NA RELVA

MUSIC TUILERIES

TEXTOS FILOSÓFICOS - FERNANDO PESSOA


Tudo é ilusão.
A ilusão do pensamento, a do sentimento, a da vontade. Tudo é criação, e toda a criação é ilusão.
Criar é mentir.
Para pensar o não‑ser criamo‑lo, passa a ser uma coisa. Todos os que pensam ocultistamente criam em absoluto todo um sistema do Universo, que fica sendo real. Ainda que se contradigam: há vários sistemas do universo, todos eles reais.
Nós próprios, porque existimos, somos criações também, portanto ilusões. Mas somos criações de quem? Do Deus que nós‑próprios criámos? Como se o criámos nós, e lhe somos portanto anteriores ? Isso é supondo real o tempo, que é outra criação nossa. Tudo é um amontoado de ilusões.
Aquilo a que chamamos verdade é aquilo a que também chamamos o ser. Verdadeiro é o que é. Mas o que é ilusão. Por isso a verdade é a ilusão, é uma ilusão.
A que abismo vamos ter?
Quanto mais forte o pensamento, o sentimento, a vontade, maior o poder criador.
O que a ocultistas é verificável é falso. Há imortalidade, mesmo eternidade da alma, mas isto é falso. Há um Deus eterno, criador do céu e da terra, e isto é falso. Ser é não‑ser.
Nunca podemos deixar de criar, por isso nunca podemos deixar de mentir.
A própria ilusão é uma ilusão.
O que nós não sentimos não existe. O que nós sentimos (...)
Só há uma coisa que não pode ser ilusão, porque ela não é criada: é a consciência. Uma só coisa escapa a toda a crítica — a consciência. A consciência não cria, nem é um conceito nosso, porque a não podemos pensar nem como sendo, nem como não‑sendo. Pensar, sentir, querer, são ilusões; mas ter consciência não é uma ilusão.
A verdade é da consciência para lá. «Deus» é a consciência da consciência, coisa que não podemos pensar.
A consciência não é concreta nem abstracta, não é um ser nem não‑ser.
Na proporção em que a consciência é uma ideia nessa é falsa.
Existem realmente Deus, céu, anjos, almas imortais e eternas. E contudo nada disso é verdade. Existe e dura eternamente, mas é falso.
O niilismo transcendental ...
Temos todos a noção de que há qualquer coisa: isso é falso. Não há; não há nem não há. A própria consciência não existe, mas é a única verdade.
Não haverá graus na ilusão? Quanto mais criadora uma coisa é mais ilusória. Partindo do nosso espírito, vemos quais as maiores ilusões ...
Tudo se reduz a criar.
Tudo se reduz a iludir-se.
Portanto criar é mentir.

sábado, 9 de janeiro de 2010

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

VAUGHAN WILLIAMS INSPIROU-SE EM WHITMAN

Ralph Vaughan Williams, (1872 — 1958)
Sinfonia: A Sea (Sinfonia No. 1), uma sinfonia coral com texto de Whitman

Toward the Unknown Region, canção para coro e orquestra, arranjo de Walt Whitman (1906)
Dona nobis pacem, texto de Walt Whitman e outras fontes (1936)
Three Poems by Walt Whitman para barítono e piano (1920

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

HÁ DEUS?

FOTOGRAFIAS DE SABASTIÃO SALGADO