KOSTABI
"A religião chegou a convencer as
pessoas de que existe um homem-invisível morando no céu, que vê tudo, todo dia,
a todo instante. E esse homem-invisível criou uma lista de 10 coisas que ele
não quer que faça. Se fizer uma dessas 10 coisas, ele tem um lugar especial
cheio de fogo, fumaça, ardor, tortura e angústia, para onde ele o envia para
sofrer e se queimar e se sufocar e gritar e chorar para todo o sempre até o fim
dos tempos...mas ele te ama!"
"Já tentei acreditar que existe um Deus
que criou cada um de nós à sua imagem e semelhança, que nos ama muito e observa
tudo. Eu realmente tentei acreditar. Mas tenho que lhes dizer a verdade: quanto
mais se vive, quanto mais se olha ao redor, mais se percebe: alguma coisa esta
errada.(...) Isso não é um trabalho bem feito, se isso é o melhor que Deus pode
fazer não me impressiona."
"Se existe um Deus, acho que a maioria
das pessoas devem concordar que Ele é, no mínimo, incompetente e talvez,
simplesmente não quer saber."
Suponhamos que suas preces não sejam
atendidas, o que diz? Oh, é desejo de Deus. Assim seja. Está bem, mas se é
desejo de Deus e se ele vai fazer o que quer de qualquer modo, pra quê serve
rezar?"
George
Dennis Patrick Carlin (Nova
Iorque, 12 de
maio de 1937 - 22 de
junho de 2008) foi um
comediante norte-americano conhecido pela sua postura crítica à religião.
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O importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós mesmos fazemos do que os outros fizeram de nós.
JEAN-PAUL SARTRE
JEAN-PAUL SARTRE
sábado, 29 de junho de 2013
DEUS
segunda-feira, 24 de junho de 2013
sábado, 22 de junho de 2013
«TODAS AS CARTAS DE AMOR SÃO RIDÍCULAS» - FERNANDO PESSOA
Fernando
e Ofélia
O encontro/desencontro
destes dois seres predestinados para nunca se encontrarem e, uma vez
encontrados, cada um deles viver, um na plena e redentora ilusão de se saber
amado – miticamente «para sempre» -, e outro num mundo alheio, insuspeitado e
ingénuo, votada à desilusão.
Se
Ofélia, tivesse lido o menor dos poemas do seu efémero e improvável «namorado»
onde nada se glosa senão a evidência de que a vida é pura Ficção e a chamada
Ficção a única e impenetrável «verdade» dela, não teria embarcado nessa travessia
do coração para um porto que nunca existiu para o companheiro/fantasma dessa
viagem sem viajante dentro. Ofélia tinha razão quando Fernando vinha com o seu
duplo infernal Álvaro de Campos, que a afastava dela. Fernando
Pessoa teve como única musa o desamor.
No
combate venceu a Literatura, monstro sublime da imaginação, única paixão que
assolou Pessoa.(Eduardo Lourenço)
ALGUMAS CARTAS DE FERNANDO A OFÉLIA, UMA DELAS ESCRITA PELO SEU HETERÓNIMO ÁLVARO DE CAMPOS:
Meu Be«be»zinho lindo:
Não imaginas a graça que te achei
hoje á janella da casa de tua irmã! Ainda bem que estavas alegre e que
mostraste prazer em me ver (Álvaro de Campos).
Tenho estado muito triste, e além d'isso
muito cansado - triste não só por te não poder ver, como também pelas
complicações que outras pessoas teem interposto no nosso caminho. Chego a crer
que a influência constante, insistente, hábil d'essas pessoas; não ralhando
contigo, não se oppondo de modo evidente, mas trabalhando lentamente sobre o
teu espírito, venha a levar-te finalmente a não gostar de mim. Sinto-me já
differente; já não és a mesma que eras no escriptorio. Não digo que tu
própria tenhas dado por isso; mas dei eu, ou, pelo menos, julguei dar por isso.
Oxalá me tenha enganado...
Olha, filhinha: não vejo nada claro no
futuro. Quero dizer: não vejo o que vãe haver, ou o que vãe ser de nós, dado,
de mais a mais, o teu feitio de cederes a todas as influencias de familia, e de
em tudo seres de uma opinião contraria á minha. No escriptorio eras mais
dócil, mais meiga, mais amorável.
Enfim...
Amanhã passo á mesma hora no
Largo de Camões. Poderás tu apparecer à janella?
Sempre e muito teu
CARTA A OFÉLIA
QUEIRÓS - 31 DE MAIO DE 1920
Bebezinho do Nininho-ninho:
Oh!
Venho só quevê pâ dizê ó Bebezinho que gotei muito da catinha dela. Oh!
E também tive munta pena de não tá ó pé do Bebé pâ le dá jinhos.
Oh! O Nininho é pequenininho!
Hoje o Nininho não vai a Belém porque, como não sabia se havia carros,
combinei tá aqui às seis ho'as.
Amanhã, a não sê qu'o Nininho não possa é que sai daqui pelas cinco e
meia. [desenho de uma meia] (isto é a meia das cinco e meia).
Amanhã o Bebé espera pelo Nininho, sim? Em Belém, sim? Sim?
Jinhos, jinhos e mais jinhos.
CARTA A OPHÉLIA
QUEIROZ – 25 DE SETEMBRO DE 1929
Exma. Senhora D. Ophélia Queiroz:
Um abjecto e miserável indivíduo chamado Fernando Pessoa, meu
particular e querido amigo, encarregou-me de comunicar a V. Ex.ª — considerando
que o estado mental dele o impede de comunicar qualquer coisa, mesmo a uma
ervilha seca (exemplo da obediência e da disciplina) — que V. Ex. ª está
proibida de:
(1) pesar menos gramas,
(2) comer pouco,
(3) não dormir nada,
(4) ter febre,
(5) pensar no indivíduo em questão.
Pela minha parte, e como íntimo e sincero amigo que sou do meliante de
cuja comunicação (com sacrifício) me encarrego, aconselho V. Ex.ª a pegar na
imagem mental, que acaso tenha formado do indivíduo cuja citação está
estragando este papel razoavelmente branco, e deitar essa imagem mental na pia,
por ser materialmente impossível dar esse justo Destino à entidade fingidamente
humana a quem ele competiria, se houvesse justiça no mundo.
Cumprimenta V. Ex. ª
Álvaro de Campos
eng. Naval
CARTA A OFÉLIA QUEIRÓS - 9 DE
OUTUBRO DE 1929
Terrivel Bébé
Gosto das suas cartas,
que são meiguinhas, e também gosto de si, que é meiguinha também. E é bombom, e
é vespa, e é mel, que é das abelhas e não das vespas, e tudo está certo, e o
bebé deve escrever-me sempre, mesmo que eu não escreva, que é sempre, e
eu estou triste, e sou maluco, e ninguém gosta de mim, e também porque é que a
havia de gostar, e isso mesmo, e torna tudo ao princípio, e parece-me que ainda
lhe telephono hoje, e gostava de lhe dar um beijo na bocca, com exactidão e
gulodice e comer-lhe a bocca e comer os beijinhos que tivesse lá escondidos e
encostar-me ao seu hombro e escorregar para a ternura dos pombinhos, e
pedir-lhe desculpa, e a desculpa ser a fingir, e tornar muitas vezes, e ponto
final até recomeçar, e porque é que a Ophelinha gosta de um meliante e de um
cevado e de um javardo e de um indivíduo com ventas de contador de gás e
expressão geral de não estar ali mas na pia da casa ao lado, e exactamente, e
enfim, e vou acabar porque estou doido, e estive sempre, e é de nascença, que é
como quem diz desde que nasci, e eu gostava que a Bebé fôsse uma boneca minha,
e eu fazia como uma criança, despia-a, e o papel acaba aqui mesmo, e isto
parece ser impossível ser escripto por um ente humano, mas é escripto por mim .
Cartas de Amor, Fernando Pessoa. (Organização, posfácio e notas de
David Mourão Ferreira. Preâmbulo e estabelecimento do texto de Maria da Graça
Queiroz.) Lisboa, Ática, 1978 (3ª ed. 1994)
segunda-feira, 17 de junho de 2013
isidore ducasse conde de lautréamont / cantos de maldoror .
Durante toda a minha
vida vi os homens, de ombros estreitos, fazerem, sem uma única excepção, actos
estúpidos e numerosos, embrutecerem os seus semelhantes e perverterem as almas
por todos os meios. Aos motivos das suas acções chamam glória. Ao ver estes
espectáculos, quis rir como os outros; mas isso, estranha imitação, era
impossível. Peguei num canivete, cuja lâmina tinha um afiado gume, e rasguei a
carne nos sítios onde os lábios se reúnem. Por um momento julguei ter atingido
o objectivo. Contemplei num espelho esta boca ferida por minha própria vontade!
Era um erro! O sangue que abundantemente corria dos dois ferimentos não deixava
aliás distinguir bem se era realmente aquele o riso dos outros. Mas, após
alguns instantes de comparação, vi claramente que o meu riso não se assemelhava
ao dos humanos, que eu não ria. Vi os homens, de cabeça feia e terríveis olhos
enterrados na órbita escura, ultrapassarem a dureza do rochedo, a rigidez do
aço fundido, a crueldade do tubarão, a insolência da juventude, a fúria insane
dos criminosos, as traições do hipócrita, os comediantes mais extraordinários,
a força de carácter dos padres, e os seres mais escondidos por fora, os mais
frios dos mundos e do céu; vi-os cansar os moralistas para descobrirem o seu
coração e fazerem recair do alto sobre eles a cólera implacável. Vi-os todos ao
mesmo tempo: ora, com o mais robusto punho erguido para o céu, como o de uma
criança, já perversa, contra a mãe, provavelmente incitados por algum espírito
do inferno, com os olhos carregados de um remorso agudo mas cheio de ódio, num
silêncio glacial, sem ousarem emitir as meditações vastas e ingratas que
abrigavam no peito, tão plenas de injustiça e de horror elas eram, e
entristecerem de compaixão o Deus de misericórdia; ora, em cada momento do dia,
desde o começo da infância até ao fim da velhice, espalhando inacreditáveis
anátemas sem senso comum contra tudo o que respira, contra si próprios e contra
a Providência, prostituírem as mulheres e as crianças e desonrarem assim as
partes do corpo consagradas ao pudor. Então, os mares erguem as suas águas,
engolem as tábuas nos seus abismos; os furacões e os tremores de terra derrubam
as casas; a peste e as diversas doenças dizimam as famílias em oração. Mas os
homens não dão por isso. Também os vi a corarem e empalidecerem de vergonha
pelo seu comportamento sobre a terra; raramente. Tempestades, irmãs dos
furacões; firmamento azulado, cuja beleza não admito; mar hipócrita, imagem do
meu coração; terra, de misterioso seio; habitantes das esferas; universo
inteiro; Deus, que com magnificência o criaste, é a ti que eu invoco: mostra-me
um homem que seja bom!... Mas que a tua graça multiplique por dez as minhas
forças naturais; pois, perante o espectáculo desse monstro, posso morrer de
espanto; morre-se por menos.
isidore ducasse
conde de lautréamont
cantos de maldoror
poesias
cantos de maldoror
poesias
.
sexta-feira, 7 de junho de 2013
BILLIE HOLIDAY: SOLO - AMADEU BAPTISTA
Não tenho mais visões, não tenho obsessões,
sigo a trompete apenas, a ternura
é esse outro lado das coisas em que me perco
porque nada mais me chama e nada mais
revejo no lentíssimo torpor que pelas veias
senti outrora num azul imenso
que mais do que tocar-me me esvaía
no inferno do mundo e em seus ramais
de pura nostalgia, tristeza e desencanto.
Só ergo agora a voz para esquecer
e ter o olhar toldado para as coisas
que como grito lancinante escuto no silêncio
enquanto outras vozes me chamam,
outros indícios me vêm perturbar
quando pressinto a noite antíquissima
em que se esconde o sobressalto da serenidade do meu tempo. Nem já a sombra aguardo
ou o sentido destes brilhos espessos,
estas chamas que consomem o meu corpo
e a minha alma no mistério de tudo
e no liminar enigma que adensa nos outros
os sentidos, certa atenção venal, um desespero
que em fumos e rastros me pergunta
por esta vida que já não é minha
e no coração recebo como salvação e ruína.
Sigo a trompete, o subtil sinal da despedida.
Só ergo agora a voz para esquecer.
Amadeu Baptista
quinta-feira, 6 de junho de 2013
AMADEU BAPTISTA - XXIX PRÉMIO POESIA CIDADE DE OURENSE
A NOITE DE PAVESE
Raras vezes me franquearam a porta
e deixaram entrar. A febre
sitia-me a alma e quem me vê
assusta-se do aspecto do meu rosto,
esta barba por fazer onde um rouxinol
se esconde. E mais ainda assusta
a minha altura, este lugar de vertigem
e palavras poderosas, a presença
de ilimitados segredos que ninguém quer
conhecer, o estremecimento que corre
nos meus ombros. Embora nada peça, sabem que
sou um pedinte. E quando entro nas casas os meus gestos afeiçoam-se a alguma
coisa enigmática que contorna o pavor e o entrega
por não se saber que espécie de vida
ou de morte vem comigo. Obviamente, eu
abençoo quem me deixa entrar, dou a entender
que alguma coisa brilha nas minhas mãos
e posso matar a fome com uma ou outra palavra
próxima do amor, um dedo nos cabelos
de quem me recebe. Subi as escadas que vão
dar a esta casa em silêncio e em silêncio aceitei
que me aguardassem com as inefáveis sombras
que vejo nos outros e tento decifrar para meu contentamento. Mandaram-me sentar
e deram-me de beber. Esse álcool
reconfortou-me a alma. E a minha gratidão
expressa-se deste modo, limpo e nítido, observando a mulher nesse sem fim das
coisas, onde todos os mistérios avançam
para uma explicação que a qualquer momento
pode irromper do espírito como uma explosão.
Olho-te nos olhos e recebo as duas moedas
que me ofereces, o teu rosto é-me familiar
se recuar à infância e subitamente perceber
que também pertenci ao exercício desta árvore
que nesta sala se levanta. Em frente,
na fotografia que o meu olhar alcança
porque me alcança o olhar que dela
se desprende, inscreve-se o enigma que me fez
aqui chegar, mais que um rumor ou um fio ténue com o nome de todas as coisas
inesperadas que me aconteceram na vida, sempre que me franquearam a porta e
deixaram entrar. Agora, com a memória de ter estado
em tua casa e ter recebido a graça de alguma
atenção, eu, que sou pedinte embora nada peça,
entrego-te este sulco da desordem
sobre a página em branco e agradeço-te
com o conhecimento de um outro mundo
ainda mais inexplicável. Não tendo havido
despedida, sabe que permaneço
e na encruzilhada das dores que me couberam
viver não esquecerei o teu nome no dia
em que também tiver partido
e mais nenhuma luz houver além daquela
que ilumina o teu rosto na solidão da noite.
Os anjos esperam-me. Não me é possível
demorar. Que me seja a alba a tua tolerância.
AMADEU BAPTISTA
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