Álvaro de Campos/Pessoa não podia ficar calado e de imediato desceu à praça pública com um "Aviso por Causa da Moral", em defesa do seu amigo Raul Leal, dizia com desvanecedora lógica e uma fina inteligência crítica: "Há três cousas com que um espírito nobre, de velho ou de jovem, nunca brinca, porque o brincar com eles é um dos sinais distintivos da baixeza da alma: são elas os deuses, a morte e a loucura. Se, porém, o autor do manifesto o escreveu a sério, ou crê louco o doutor Raul Leal, ou não crendo, usa o parecer crê-lo para o conspurcar. Só a última canalha das ruas insulta um louco, e em público. Só qualquer canalha abaixo dessa imita esse insulto, sabendo que mente". .../...
…/… "Ser novo é não ser velho. Ser velho é ter opiniões. Ser novo é não querer saber de opiniões para nada. Ser novo é deixar os outros ir em paz para o diabo com as opiniões que têm, boas ou más - boas ou más, que a gente nunca sabe com quais é que vai para o diabo". E, logo em seguida, Campos concluía assim o seu aviso público: "Mas, quanto ao resto, calem-se o mais silenciosamente possível. Porque só há duas maneiras de se ter razão. Uma é calar-se, que é a que convém aos novos. A outra é contradizer-se, mas só alguém de mais idade a pode cometer. Tudo o mais é uma maçada para quem está presente por acaso. E a sociedade em que nascemos é o lugar onde mais por acaso estamos presentes". .../...
Pessoa concluía deste modo a sua intervenção: "Aos estudantes de Lisboa não desejo mais - porque não posso desejar melhor - de que um dia possam ter uma vida tão digna, uma alma tão alta e nobre como as do homem que tão nesciamente insultaram. A Raul Leal, não podendo prestar-lhe, nesta hora da plebe, melhor homenagem, presto-lhe esta, simples e clara, não só da minha amizade, que não tem limites, mas também da minha admiração pelo seu alto génio especulativo e metafísico, lustre que será da nossa grande raça. Nem creio que em minha vida, como quer que decorra, maior honra me possa caber que a presente, que é a de tê-lo por companheiro nesta aventura cultural em que coincidimos, diferentes e sozinhos, sob o chasco e o insulto da canalha»
Em 1935, quando o fascismo se consolidava Pessoa escreveu uma carta a Carmona, que não chegou a enviar, onde dizia, "que até aqui a Ditadura não tinha tido o impudor de renegando toda a verdadeira política do espírito - isto é, o de pôr o espírito acima da política - vir intimar quem pensa a que pense pela cabeça do Estado, que a não tem, ou de vir intimar a quem trabalha a que trabalhe livremente como lhe mandam".
As pesquisas que tenham feito na Internet, fazem bastante referência a esta situação (a que já fiz referência aqui no blogue), mas relativamente à obra de Raul Leal não encontrei nada.
Em 1935, quando o fascismo se consolidava Pessoa escreveu uma carta a Carmona, que não chegou a enviar, onde dizia, "que até aqui a Ditadura não tinha tido o impudor de renegando toda a verdadeira política do espírito - isto é, o de pôr o espírito acima da política - vir intimar quem pensa a que pense pela cabeça do Estado, que a não tem, ou de vir intimar a quem trabalha a que trabalhe livremente como lhe mandam".
As pesquisas que tenham feito na Internet, fazem bastante referência a esta situação (a que já fiz referência aqui no blogue), mas relativamente à obra de Raul Leal não encontrei nada.
LIVROS: Orpheu (Edição Facsimilada), Contexto, 1989 [Apenas o conto Atelier); MONTEIRO, Adolfo Casais, A Poesia da Presença, Moraes-Editores, 1972 [nada de nada]
O RAUL LEAL ERA
O Raul Leal era
O único verdadeiro doido do "Orpheu".
Ninguém lhe invejasse aquela luxúria de fera?
Invejava-a eu.
Três fortunas gastou, outras três deu
Ao que da vida não se espera
E à que na morte recebeu.
O Raul Leal era
O único não-heterónimo meu.
Eu nos Jerónimos ele na vala comum
Que lhe vestiu o nome e o disfarce
(Dizem que está em Benfica)
ambos somos um
Dos extremos do mal a continuar-se.
Não deixou versos?
Deixei-os eu,
Infelizmente,
a quem mos deu.
O Almada?
O Santa-Ritta?
O Amadeo?
Tretas da arte e da era.
O Raul era Orpheu.
Mário Cesariny
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