O importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós mesmos fazemos do que os outros fizeram de nós.
JEAN-PAUL SARTRE

sábado, 1 de maio de 2010

SEXTA DE MAHLER (GRANDES EMOÇÕES)



Esta sinfonia vai suscitar muitos enigmas que só uma geração que tenha compreendido e digerido as minhas primeiras cinco sinfonias pode vir a entenderGUSTAV MAHLER

A SEXTA SINFONIA de Mahler expressa a luta do Homem contra a matéria, a tentativa de afirmar a capacidade individual da vontade humana, contra a violenta inevitabilidade do destino. No fim vence a resignação, a força do destino e a solidão fundamental do indivíduo singular – mas trata-se de uma vitória de Pirro para a matéria: através da derrota, o Homem supera-se a si mesmo, alcançando esferas existenciais mais elevadas. A solidão, a ânsia por um inalcançável Olimpo e a pesada derrota corporal são representadas simbolicamente por três instrumentos de percussão, cujo uso dentro de uma obra sinfónica é pioneiro: os chocalhos de vaca (cowbells) simbolizando a solidão humana radical, a celesta sugerindo um Olimpo almejado, e o martelo (como um golpe seco de machado) representando a derrota física e psíquica completa.
Esta obra é dramática, existencialmente negativista e essencialmente trágica. As luminosas caminhadas solitárias, na alta montanha dos Alpes austríacos (com a companhia apenas de chocalhos de vacas), conduzem Mahler à profundidade tenebrosa da sua psique (onde os violentos golpes de martelo repercutiam intensamente).
A SEXTA revela uma mente ao mesmo tempo perturbada e visionária, confiante e aterrada, desejosa de viver mais, contemplando a morte olhos nos olhos.


PRIMEIRO ANDAMENTO – allegro, enérgico, ma non troppo

É como uma marcha imparável e impiedosa, de fôlego ininterrupto e carácter vincado. O segundo tema do primeiro andamento é conhecido como o «Tema de Alma», dedicado à mulher, como também lhe foi dedicada parte da QUINTA. Acaba com uma fanfarra de júbilo: o Homem está ainda firme no mundo, mesmo se já teve uma visão da sua radical solidão.


SEGUNDO ANDAMENTO – Scherzo, Wuchig/Trio, Alväterisch, grazioso

Mahler dedica-se a uma das suas especialidades, criar distâncias incómodas entre o que a música «promete» e aquilo que de facto oferece. Este andamento consiste num jogo alternado de danças, compassos e métricas: uma sequência de caricaturas de Ländlers e Minuetos, ou simplesmente uma brincadeira de crianças endiabradas, intercaladas por dois trios serenos e tranquilos.

TERCEIRO ANDAMENTO: Andante Moderato

Oscila entre um lirismo exacerbado de cariz «pós-schubertiano», passagens quase Berceuse, erupções apaixonadas e subtis confidências poéticas. Parece sugerir uma reflexão sobre o universo feminino que rodeava Mahler (a mulher, Alma, duas filhas e a irmã do compositor).

QUARTO ANDAMENTO: Finalle: Allegro moderato/ allegro enérgico

Chegamos à catarsis, um dos movimentos mais dramáticos de toda a música Ocidental, que vai desenvolver um sentido de catástrofe contínua, irreversível e conclusiva.
Na luminosa observação de Erwin Ratz, o «fim», a «morte», a derrota sem apelo do herói, adquire aqui um novo sentido: o Homem cumpriu a sua missão. Mesmo que tenha aparentemente perdido, que tenha sido lançado no mais fundo dos abismos, a sua individualidade alcançou esferas mais elevadas. Deste modo a morte não é um fim, os golpes violentos do martelo aniquilam o elemento físico e psicológico, mas é através dessa destruição que se alcançam novos, infinitos e impalpáveis universos.


[Informações colhidas: programa da Casa da Música (Paulo Pereira de Assis)]


ORQUESTRA NACIONAL DO PORTO regida por TAKUO YUASA.
CASA DA MÚSICA - 30.04.2010

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