JEAN-PAUL SARTRE
segunda-feira, 30 de agosto de 2010
POEMAS DE FERNANDO NAMORA
sábado, 28 de agosto de 2010
SIMONE DE BEAUVOIR - «SEGUNDO SEXO»
Era a mais velha de duas filhas de Georges de Beauvoir, um advogado, e Françoise Brasseur. Simone mais tarde optou por se livrar das suas origens burguesas. Foi professora de filosofia até 1943 em escolas de diferentes localidades francesas. Morreu de pneumonia em Paris, aos 78 anos
As suas obras oferecem uma visão reveladora da sua vida e do seu tempo.
No seu primeiro romance, A Convidada (1943), explorou os dilemas existencialistas da liberdade, da acção e da responsabilidade individual, temas que abordou igualmente em romances posteriores como, O Sangue dos Outros (1944) e Os Mandarins (1954), obra considerada a sua obra-prima e pela qual recebeu o Prêmio Goncourt.
As teses existencialistas, segundo as quais cada pessoa é responsável por si própria, introduzem-se também numa série de obras autobiográficas, além de Memórias de uma moça bem-comportada, A Força das Coisas e Tudo Dito e Feito. Entre os seus ensaios críticos cabe destacar, O Segundo Sexo, uma profunda análise sobre o papel das mulheres na sociedade; A velhice, sobre o processo de envelhecimento, onde teceu críticas apaixonadas sobre a atitude da sociedade para com os velhos e A cerimonia do Adeus (1981), onde evocou a figura do seu companheiro de tantos anos, Sartre.
CONSULTA: AQUI
Simone, conheceu Sartre, quando foi com Maheu e Nizan ao seu quarto, para estudar Leibniz. Logo no primeiro encontro percebeu que Sartre era o que mais sabia do grupo. Sartre tinha 23 anos, Simone, 21. Depois desse primeiro contacto, seguiu-se um período de alegre camaradagem entre Simone e os três rapazes, que a consideravam como uma igual. Simone apesar de ser de uma família burguesa e com formação católica, era uma rapariga desinibida. Em pouco tempo, a amizade de Sartre prevaleceu sobre a dos outros dois. Formaram um casal, cujo entendimento funcionou, Sartre não privava Simone da sua liberdade e Simone era uma mulher antiburguesa que não queria casamento, filhos, nem bens patrimoniais comuns.
Beauvoir, teve uma forte relação com o escritor norte-americano Nelson Algren logo após a guerra, e na década de 1950 manteve outra relação de oito anos com Claude Lanzmann, autor de Shoah, e antigo aluno de Sartre. No Verão, era comum Beauvoir e Lanzmann viajarem com Sartre e a sua amante Michelle Vian, ex-esposa do escritor Boris Vian.Depois postumamente soube-se da vida pessoal de Simone, com mais detalhe e para muitos as suas contradições vão contra as suas ideias relativamente à mulher e principalmente ao seu livro O SEGUNDO SEXO, que despertou milhões de mulheres e as lançou na liberdade e na revolta. Contrariamente ao que dizia no livro, a sua ligação com Nelson Algren foi de grande submissão e dependência.
E isso não era tudo. Simone, era lésbica. Dava aulas de filosofia e tinha um grande interesse pelas suas alunas inteligentes e bonitas, que seduzia, usava-as e passava-as a Sarte. A sua vida amorosa era um trio, ela, Sartre o «amor necessário» e os «amores contigentes»Isto é incomodo para Simone de Beauvoir que sempre tinha negado ser homossexual ou bissexual. Essa omissão, essa negação, é lamentável, sobretudo partindo de uma pessoa que sempre se jactou de nunca mentir, de estar acima da mentira. Isso causou perplexidade. Sobretudo nas mulheres e principalmente para as feministas.No seu livro O SEGUNDO SEXO, ela considera que as lésbicas seguem caminhos condenados, embora rectifique falsas certezas da psicanálise sobre o lesbianismo. Simone não estava preparada para se reconhecer como lésbica, no seu livro a sua concepção da emancipação feminina é a sua fraternidade com o homem, consolidada pela independência económica.
Mesmo durante os anos do MLF (Mouvement de Libération des Femmes — Movimento de Libertação das Mulheres), em que as lésbicas enfim, tiveram voz pública, Simone de Beauvoir jamais disse uma palavra de apoio, preferindo o combate a favor do aborto. Este silêncio sobre a homossexualidade tem uma razão, e pode explicar-se pelas suas ideias filosóficas. O materialismo existencial, que fundamenta a sua análise da opressão das mulheres, bloqueia o amor lésbico como uma dinâmica emancipadora. Pois se a mulher é o Outro, se a feminilidade é socialmente construída, se o amor é uma alienação livremente consentida, como é que uma mulher poderia construir a sua identidade de sujeito livre através de um amor por outra mulher? É impossível, e compreende-se porque tal visão da mulher “relativa” não pode desembocar numa análise da homofobia. Seria preciso que “a essência” não sucedesse à existência, que ela fosse ao menos co-originária para que o desejo homossexual fosse incluído como uma das dimensões da identidade humana.
A frase que inicia o capítulo de O Segundo Sexo sobre o lesbianismo é reveladora desta posição de identidade insustentável que teve Beauvoir do pós-guerra até à sua morte em 1986. “... a mulher sempre será frustrada como indivíduo activo”. “Não é o órgão da possessão que ela inveja no homem, mas a sua presa”. Eis as palavras extremamente reveladoras de sua relação com a mulher desejada e o mundo masculino. A mulher é uma “presa” sexual, um objecto de consumo, de devoração.
Pode-se imaginar em que contradições, Simone de Beauvoir, se debatia. Uma avidez existencial sem precedentes que incluía a volúpia feminina, uma paixão absurda por Sartre que lhe impôs amantes que ela “dividia” com ele. Enfim, um desgosto pela feminilidade concebida como puro produto da dominação não lhe ajudou em nada a abandonar o silêncio de sua práxis lésbica.
O Segundo Sexo, publicado em 1949 provocou escândalo, era uma análise política sem precedentes da questão feminina. Beauvoir demonstrava que a inferioridade feminina não é natural e sim construída socialmente. Muitos homens revoltavam-se contra o livro, enquanto as mulheres o liam. Até à sua morte, milhares de mulheres escreveram a Beauvoir, algumas para dizer que o seu livro as tinha salvo. A americana Betty Friedan dedicou-lhe, em 1963, A Mulher Mistificada, segunda obra fundadora do feminismo.Durante toda a vida, tal como Sartre, Beauvoir serviu-se de sua notoriedade para defender os intelectuais e os “oprimidos”, especialmente as mulheres. Nos últimos quinze anos da sua vida, encontrou nas mulheres do “movimento”, um radicalismo e uma exigência de clareza à sua medida e ela colaborava nesse movimento entusiasmada, “porque elas não eram feministas para tomar o lugar dos homens, mas sim para mudar o mundo”. Ela criou a associação, Escolher para o Direito a uma Maternidade Desejada, em conjunto com a advogada Gisèle Halimi, o Centro Audiovisual Simone-de-Beauvoir, com a atriz Delphine Seyrig e Carole Roussopoulos e a Liga do Direito das Mulheres.
No seu centenário (1908-2008), em França foi feita uma homenagem a Simone de Beauvoir. Fadela Amara, secretária de Estado do governo Sarkozy, encabeçou as suas felicitações com a seguinte frase: "Ser livre é querer a liberdade dos outros", citação de Simone de Beauvoir. O facto de uma ministra de um Executivo que tem entre seus objectivos "acabar com o pensamento de Maio de 68" citar Beauvoir, fundadora do feminismo moderno, maoísta ocasional, que se autodefinia como "totalmente de esquerda" e desejosa da queda do capitalismo, combinou mal com o lema sarkozista de "trabalhar mais para ganhar mais".
Hoje, através de biografias, depoimentos e análises, o que Sartre e Beauvoir simbolizaram é criticado por alguns. Não foram tão "resistentes" como diziam, não foram tão "livres" como pareciam, não tiveram tanta razão como se acreditava. E o marxismo já não é o sistema filosófico, e sim mais um entre eles, como esse existencialismo do qual eles foram os profetas.
Mas cerca de 1,2 milhão de exemplares foram vendidos desde 1949 (só em francês) de O Segundo Sexo, livro de referência do feminismo e consequente influência do mesmo na evolução da mentalidade contemporânea. Assim como é preciso considerar todas as outras obras que escreveu. Tudo contribuiu para fazer de Simone de Beauvoir num mito, embora alguns aproveitem só para descobrir que seus pés eram de barro. Com efeito, de barro humano. Sartre e Simone de Beauvoir são figuras mundiais respeitadas, curiosamente mais nos EUA do que em França.http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/elpais/2008/01/12/ult581u2409.jhtm
[C&H]
quinta-feira, 26 de agosto de 2010
PANFLETO.Fere-me esta idolatria mais do que todos os crimes:
Tanto fervor desviado e perdido!
Tanta gente ajoelhando à passagem do tempo
e tão poucos lutando para lhe abrir caminho!
Há uma vida inteira a jogar e gastar
no pano verde imenso das campinas do mundo.
Há desertos cativos de uma ausência dos povos.
Há uma guerra devastando a vida,
enquanto a supuserem redimida!
E em nós a redenção quase perdida!..
Vamos rasgar, ó poetas, esta mentira da alma,
vamos gritar aos homens que os enganam,
que não é a força, que não é a glória,
que não é o sol nem a lua nem as estrelas,
nem os lares nem os filhos, nem os mares floridos,
nem o prazer nem a dor nem a amizade,
nem o indivíduo só compreendendo as causas,
nem os livros nem os poemas, nem as audácias heróicas,
— a redenção sou eu, se formos nós sem forma,
sem liberdade ou corpo, sem programas ou escolas!
Aqui está a redenção. Tomai-a toda
E se é verdade a fome
se é verdade o abismo,
se é verdade o pensamento húmido
que pestaneja ansioso nos cortejos públicos,
se são verdade as redenções que mentem:
Matem essa gente para salvar a Vida!
E matem-me com elas para que as queime ainda!
.
Recuso-me a aceitar o que me derem.
terça-feira, 24 de agosto de 2010
DOCUMENTÁRIO DE AGUSTINA BESSA-LUÍS
"Eu não me levo muito a sério. É a melhor maneira de viver. Aquele que se leva a sério está sempre numa situação de inferioridade perante a vida."
O seu primeiro livro foi o «Mundo Fechado» e desse livro, mandou cópias aos escritores, que na altura ela considerava importantes: Pascoaes, Torga, Aquilino, Ferreira de Castro.
Torga não respondeu, Pascoaes estava muito doente e pouco depois morreu, mas mais tarde foram encontrados nos seus papeis uns apontamentos para Agustina, favoráveis ao livro.
"Escrever é comover para desconvocar a angústia e aligeirar o medo...Ama-se a palavra usa-se a escrita despertam-se as coisas do silêncio em que foram criadas."
A sua escrita, são divagações sobre a condição humana. Uma visão cáustica, cruel e implacável sobre as paixões, com falhas de coerência e lógica, porque elas também existem na vida real.
Os seus grandes influenciadores foram, Dostoievsky e Freud, porque eles foram ao fundo da alma.
O seu romance preferido: Um Inverno Frio.
A Capacidade de Adaptação dos Portugueses
Os observadores estrangeiros maravilham-se de que Portugal resista à crise política e económica com tal poder de adaptação. Há nos Portugueses uma sinceridade para com o imediato que desconcerta o panorama que transcende o imediato. O infinito é o que eu situo - dizem. E assim vivem. Protegidos talvez por essa condição de afecto pelas coisas, pelos seus próprios delitos, que não consideram dramáticos, só ao jeito das necessidades. De resto — quem se apresenta a salvar-nos que não esteja suspeitamente indignado? Os que muito se formalizam muito escondem; os que acusam demasiado privam-se de ser leais consigo próprios. O país não precisa de quem diga o que está errado; precisa de quem saiba o que está certo.
Agustina Bessa-Luís, in 'Dicionário Imperfeito'
Garras dos sentidos
domingo, 22 de agosto de 2010
LOU ANDREAS-SALOMÉ - UMA MULHER SEDUTORA, APAIXONADA E LIVRE
"Ouse, ouse... ouse tudo!!
Não tenha necessidade de nada!
Não tente adequar sua vida a modelos,
nem queira você mesmo ser um modelo para ninguém.
Acredite: a vida lhe dará poucos presentes.
Se você quer uma vida, aprenda ... a roubá-la!
Ouse, ouse tudo!
Seja na vida o que você é, aconteça o que acontecer.
Não defenda nenhum princípio,
mas algo de bem mais maravilhoso:
algo que está em nós e que queima como o fogo da vida!!"
"No mais profundo de si mesmo, o nosso ser
rebela-se em absoluto contra todos os limites.
Os limites físicos são-nos tão insuportáveis quanto
os limites do que nos é psiquicamente possível:
não fazem verdadeiramente parte de nós.
Circunscrevem-nos mais estreitamente do que desejaríamos."Lou Andréas-Salomé
Nietzsche continuava obcecado pela ambição de formar um discípulo que pudesse ser iniciado na sua filosofia e, a inteligência e independência de Lou, imprimiram um novo rumo à sua existência. Em Lucerna, no Löwengarten, onde voltaram a reunir-se mais tarde, Nietzsche pediu-a novamente em casamento, mas Lou manteve a sua recusa obstinada, deixando o filósofo estarrecido com a declaração de que lhe interessava unicamente cumprir a vontade de viver e entregar-se ao estudo da filosofia e da literatura.Perante os projectos de Lou, que mantinha firme a ideia de viver com os dois filósofos, os irmãos tentaram demovê-la e impedir o escândalo, procurando fazê-la regressar a São Petersburgo. Entretanto, Nietzsche introduzira Lou no seu círculo de artistas e intelectuais de Bayreuth, onde ela provoca uma onda de choque pela sua audácia. A irmã de Nietzsche, Elisabeth, via com maus olhos as atitudes daquela jovem mundana e cheia de vitalidade, chegando a provocar altercações violentas e tentando, a todo o custo, destruir a relação entre Lou e o irmão. Por fim, o amor de Nietzsche transformou-se em amargura e decepção. A sistemática recusa de Lou levou-o ao desespero, à beira do suicídio. Só a embriaguez do ópio o salvava dessa dor lancinante, cuja experiência, depois de amadurecida o levou a começar a escrever, Assim Falava Zaratustra. Foi assim que Nietzsche se libertou do fascínio que Lou exercia sobre ele. Jamais voltariam a encontrar-se. Na verdade, a sua irmã Elisabeth minara todas as relações entre os membros do círculo. O debate suscitado e os escândalos daí resultantes, alimentando a voracidade de um público ávido, remeteu Lou para um silêncio do qual não voltou a sair. Respondeu sempre com um muro de silêncio que não a beneficiava, uma vez que não contribuía para clarificar a situação. Todavia, o afastamento de Nietzsche não lhe causou tanto dano que não permitisse que ela continuasse unida a Rée, encontrando, junto dele, não apenas a atenção e a ternura, como um certo apaziguamento. Juntos, reuniram à sua volta alguns dos espíritos mais promissores da época, como o crítico Georg Brandes, um dos primeiros autores a compreender o impacto da filosofia de Nietzsche, Hermann Ebbinghaus, fundador da Psicologia, e Ferdinand Tönnies, fundador da Sociologia.Alguns deles declarar-se-ão a Lou e ela recusará todos os pedidos, convertendo-os em amigos enquanto mantém Rée junto de si. Em 1886, porém, o amigo sentir-se-á traído. A 1 de Novembro, a celebração do noivado secreto de Lou com Andreas, de cuja chegada Rée não se apercebera e que irá ocupar o seu lugar, obriga-o a partir, em princípios de 1887, pondo termo a quatro anos de vida em comum. O sentimento de culpa atormentá-la-á mais tarde, ao saber que Rée foi encontrado morto, em 1901, em circunstâncias estranhas.Quer Malwida, quer Rée, tão próximos de Lou, ignoravam tudo acerca de Andreas. Porque razão, a certa altura, Lou decidiu casar? O que a terá motivado? A diferença de idades era considerável. Ele tinha 41 anos e ela 26. Príncipe e beduíno do deserto, numa sociedade na qual não se integrava e cujas regras tinha dificuldade em aceitar, era uma figura singular, tanto pela linhagem como pela experiência de vida, pois era filho de um arménio e nascera na Indonésia, em Jacarta. Quando jovem estudara no liceu de Genebra e destacara-se como aluno brilhante pelas suas aptidões musicais e linguísticas. Consagrara-se ao estudo das línguas orientais e tinha obtido o doutoramento em 1868, dedicando-se à leitura de manuscritos persas raros.Para Lou, Andréas encarnava, o ideal do sábio universal das épocas anteriores, o príncipe e o camponês, segundo o modelo russo. A aventureira deixara-se fascinar por esse poliglota que se afastava dos intelectuais que ela conhecera até então. Andreas destacava-se deles por uma “soberania das mais reais”, fazendo-a sonhar com viagens à Pérsia, indo ao encontro do seu lado selvagem e transmitindo-lhe um misto de doçura e de rebeldia. O casamento, nada convencional, foi realizado em 1887. O projecto de vida comum estabeleceu-se com base numa comunhão de gostos e de estudos, tratando-se de uma união puramente intelectual. Lou obteve de Andreas a garantia formal de que nunca teriam filhos. Revoltava-se contra a ideia de pôr no mundo uma criança indesejada e não suportava a ideia de dar à luz. Repudiava qualquer ligação entre amor carnal e casamento, uma convicção, que Andreas esperava ver alterada, mas jamais se modificará
Em 1890, a adesão do casal à Associação do Teatro Livre veio proporcionar a Lou os contactos que faltavam. Foi Georg Brandes, crítico dinamarquês, que redigiu uma carta de apresentação para o Deutsche Rundschau. Quanto a Wilhelm Bölsche, crítico, romancista e ensaísta, introduziu o casal no círculo de Friedrichsagen. Lou conheceu aí jovens escritores para quem a literatura, bem longe de ser um passatempo frívolo, era um imperativo de ordem existencial, um conceito a que imediatamente aderiu, tendo começado a escrever para duas publicações berlinenses de renome e participando da vanguarda literária e artística mais prestigiada da época, com Tolstoi, Maupassant, D’Anunzio e Knut Hamsun. Nesta boémia literária, cuja fantasia a afastava da austeridade e da disciplina do círculo de Rée, a mulher de quase trinta anos conheceu Georg Ledebour, conhecido pela sua liberdade, que o impedia de se subjugar à religião ou às convenções sociais. Foi essa fusão entre delicadeza e firmeza que atraiu Lou. Embora sensível ao fascínio desse terno amigo que lhe declara o seu amor, Lou resistiu-lhe, mas tal paixão provocou uma crise conjugal.Esse aspecto doloroso da sua vida irá reflectir-se na sua obra, numa fase em que escreve com uma tenacidade obstinada, uma actividade que foi injustamente negligenciada, pela dispersão por várias colunas de jornais. Dedicou-se igualmente à ficção, publicando, em 1885 Combate Por Deus e, em 1895, Ruth, o seu segundo romance, onde trata, ainda, a sua obsessão por Gillot.Em 1894, a escritora desembarcou em Paris, onde foi aceite pela sociedade boémia e literária e conquistou a admiração dos críticos mais influentes, como escritora e ensaísta. Começou a corresponder-se com Schnitzler, que ela admirava profundamente. Mas em relação a esse tempo de Paris, onde redescobriu os prazeres mundanos, Lou confessou um certo desencanto, provocado por um afastamento do seu trabalho. De volta a Berlim, permaneceu aí durante o tempo estritamente necessário. Trazia de tal modo entranhado o gosto pelas viagens que partiu, ao fim de seis meses, para S. Petersburgo onde reviu a família e Gillot. Regressada a Viena, onde a atmosfera era semelhante à de Paris, encontrou Schnitzler e travou conhecimento com Hofmannsthal, Beer-Hofmann e Friedrich Pineles, o médico a quem se ligará numa intensa e duradoura relação. Pineles tinha na altura vinte e sete anos e Lou trinta e quatro. Nessa sociedade brilhante, extremamente requisitada e apreciada pela sua capacidade de comunicação, Lou revelava uma lenta eclosão, que fez com que Schnitzler traçasse dela o retrato de uma mulher volúvel, deslumbrante e desinibida, de uma euforia e um gosto pela vida invulgares.Quando Lou e Rilke se encontraram, o poeta era um jovem de 21 anos, com um talento prodigioso, em busca de reconhecimento literário. Colaborava em vários jornais e revistas e era, ele próprio, editor de uma revista que pretendia divulgar as novas tendências da poesia. A relação que se estabeleceu entre ambos foi a de mãe-amante. Procuraram um refúgio nas montanhas, longe do bulício da cidade. Foi sob o olhar de Lou que Rilke iniciou um novo período de intensa produtividade literária. Lou, estava fascinada pelo ardor do poeta e pela sua virilidade amenizada pela doçura. Stéphane Michaud, na sua biografia, refere que a fase mais intensa da paixão entre ambos ocorreu entre 1897 e 1901, mas Lou, de comum acordo com Rilke, queimou as cartas relativas a esses anos.
Em 1898, Rilke, Andréas e Lou deixaram Berlim em direcção a Moscovo. Os viajantes partilhavam a mesma paixão pela Rússia antiga, pelas suas paisagens e pelo seu povo. Paradoxalmente, esta viagem afasta Lou de Rilke. O seu diário deixa compreender como a imagem do pai se sobrepõe à do amante. Lou sentiu-se incomodada pela presença de Rilke, forçando-o a partir. Sem remorso, considerou natural que se afastassem para que ambos pudessem crescer.Sob a orientação do psicoterapeuta sueco Poul Bjerre, Lou iniciou-se no estudo da Psicanálise. Mais tarde, afastando-se da posição teórica de Bjerre, que se distingue de Freud, Lou tornou-se de uma fidelidade inquebrantável relativamente ao fundador da psicanálise, durante vinte e cinco anos. Só a morte de Lou porá termo a essa relação. Freud confiou-lhe também a orientação da filha Anna, estabelecendo-se entre os três uma cumplicidade intensa. Depois da Guerra, quando Lou sofreu dificuldades económicas, foi o seu dedicado amigo Freud quem a ajudou.
Na última fase da sua obra, Lou procurou conciliar a influência da psicanálise - ela própria torna-se psicanalista - com a literatura. Nasceram dessa confluência, os seus mais estranhos contos, povoados por figuras e personagens que se apresentavam como representações simbólicas e intensas. De alguma forma, a sua obra surgiu integrada numa contra-corrente literária, pois na literatura alemã distinguiram-se outros autores, mais marcados pela vanguarda da estética expressionista, mais trabalhada pela política, como é o caso de Döblin, de Kastner ou, ainda, de Werfel. Finalmente, Lou escreveu, As Memórias, obra que se revelará posteriormente, como um manancial e um testemunho da sua vida, mas onde a sua postura se mantém discreta e reservada. Lou sabia exactamente que compunha a derradeira imagem com que havia de deixar o mundo: a de uma mulher com uma beleza que a acompanhará até ao final da sua vida, tendo sempre do seu lado a vida (como dela disse um dia Rilke) e uma capacidade de dádiva que apenas se encontra nas almas superiores. Disso são prova as relações constantes e duradouras que manteve com os homens (amigos e amantes) até ao final da sua vida que terminou a 5 de Fevereiro de 1937, pouco antes de completar setenta e seis anos. Uma morte discreta a celebrar o esplendor do que foi a sua vida, guiada por uma liberdade radical.
Fonte: Michaud, Stéphane - Lou Andreas-Salomé - Edicões Asa, 2001(Stéphane Michaud é um estudioso da vida e da obra de Lou – Andreas Salomé, escreveu uma biografia apaixonante, que pela primeira vez, teve acesso a fontes até agora interditas.)
sexta-feira, 20 de agosto de 2010
ALBERTO DE LACERDA (1928-2007)
SOBRE ALBERTO DE LACERDA:
Alberto de Lacerda. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2010. [Consult. 2010-08-17].Disponível na www:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Alberto_de_Lacerda
Não encontraste a rua
Mas a cidade é esta
Não encontraste o rosto
O anel caiu
Que maravilha um copo de água!
Ó material, imaterial
Ó doçura que nos inunda
Mudo? Não sei. Talvez caudal
quinta-feira, 19 de agosto de 2010
BERNARDO SOARES - AGI SEMPRE PARA DENTRO...NUNCA TOQUEI NA VIDA...
Gostava de passear sozinho pelas alamedas e pelos grandes corredores e de comandar as árvores e desafiar os retratos das paredes... No grande corredor sombrio que há ao fundo do palácio passeei com a minha noiva muitas vezes... Eu nunca tive noiva real... Nunca soube como se amava... Apenas soube como se sonhava amar... Se eu gostava de usar anéis de dama nos meus dedos é que às vezes queria julgar que as minhas mãos eram de princesa e que eu era, pelo menos no gesto das minhas mãos, aquela que eu amava...
Um dia foram-me encontrar vestido de rainha... Eu estava sonhando que eu era a minha esposa régia... Gostava de ver a minha face reflectida porque podia sonhar que era a face de outra criatura — porque era de formas femininas, que era de minha amada que era a minha face reflectida... Quantas vezes a minha boca, tocou na minha boca nesse espelho!... Quantas vezes apertei uma das mãos com a outra, quantas adorei meus cabelos com a minha mão alheada para que parecesse dela ao tocar-me. Não sou eu que te estou dizendo isto... É o resto de mim que está falando.
s.d.
Livro do Desassossego. Vol.I. Fernando Pessoa. (Organização e fixação de inéditos de Teresa Sobral Cunha.) Coimbra: Presença, 1990. - 76.
HERMAN LEONARD (1923-2010) - FOTÓGRAFO DO JAZZ
Leonard começou a sua carreira nos anos 40, por ser amante da música jazz - como não tinha dinheiro para entrar nos clubes de Nova Iorque (como os Royal Roost, Birdland ou Bop City) foi através da fotografia que conseguiu assistir a concertos. Viveu em Nova Iorque, depois em Paris, e fotografou todos os nomes importantes do jazz. Captou para a posteridade Dexter Gordon, Charlie Parker, Dizzy Gillespie, Billie Holiday, Duke Ellington, Miles Davis, entre outros.
Durante algum tempo foi o fotógrafo pessoal de Marlon Brando, e também fotografou para a revista “Playboy” norte-americana. Em 2006, o fotógrafo perdeu grande parte dos seus bens por causa do furacão Katrina que atingiu a sua casa em Nova Orleães e destruiu mais de 8 mil fotografias. Mas os negativos foram salvos, pois estavam depositados no Ogden Museum of Southern Art. O fotógrafo trabalhava agora com o músico Lenny Kravitz. Leonard é autor do livro “The Eye of Jazz” (editora Viking) e de “Jazz” que será publicado em Novembro pela Bloomsbury nos Estados Unidos.
(Jornal Público)
terça-feira, 17 de agosto de 2010
William Shakespeare - SONETO LXX
That thou art blamed shall not be thy defect,
For slander's mark was ever yet the fair;
The ornament of beauty is suspect,
A crow that flies in heaven's sweetest air.
So thou be good, slander doth but approve
Thy worth the greater, being woo'd of time;
For canker vice the sweetest buds doth love,
And thou present'st a pure unstained prime.
Thou hast pass'd by the ambush of young days,
Either not assail'd or victor being charged;
Yet this thy praise cannot be so thy praise,
To tie up envy evermore enlarged:
If some suspect of ill mask'd not thy show,
Then thou alone kingdoms of hearts shouldst owe.
SONETO LXX
Se te censuram, não é teu defeito,
Porque a injúria o mais belo pretende;
Da graça o ornamento é vão, suspeito,
Corvo a sujar o céu que mais esplende.
Enquanto fores bom, a injúria prova
Que tens valor, que o tempo te venera,
Pois o Verme na flor gozo renova,
E em ti irrompe a mais pura primavera.
Da infância os maus tempos pular soubeste,
Vencendo o assalto ou do assalto distante;
Mas não penses achar vantagem neste
Fado, que a inveja alarga, é incessante.
Se a ti nada demanda de suspeita,
És reino a que o coração se sujeita.
trad. Diego Raphael
segunda-feira, 16 de agosto de 2010
JULIEN GRACQ (1910 - 2007)
Cracq escreveu dois romances excepcionais, Le Rivage des Syrtes e Un Balcon en Forêt, além de obras contundentes de crítica e ensaio. Grande admirador de Ernst Jünger. Professor de História e Geografia, recusou o Prémio Goncourt. Esteve próximo dos surrealistas, tendo sido amigo de André Breton, mas recusou ser assimilado.
Um escritor alérgico aos holofotes, de tempos a tempos, lançava um livro, mostrando que era um visionário, tal a sua capacidade de narrar histórias inquietantes e desconcertantes.
BIOGRAFIA COMPLETA: AQUI
LE RIVAGE DES SYRTES – Tradução de Pedro Tamen. É o seu romance mais célebre e uma arrebatadora obra de ficção europeia do século XX.
Uma cidade, capital de um império em declínio, consome-se na espera de um inimigo virtual. Esta capital do rumor, é o centro de todas as intrigas, o cadinho de todos os presságios, o vulcão de todas as superstições. Sonâmbulos, os habitantes da cidade vegetam na sombra da ameaça ancestral: acabarão a desejar o ataque libertador, que os devolva à sua antiga condição de seres com história.
Uma sensação de vento nas têmporas, é o que causam os seus livros, escritos num francês de tal riqueza lexical e sintáctica, que chega a ser estonteante. Gracq é um mago, a quem não fazia falta trazer a filosofia para a ficção, porque a sua ficção era toda ela metafísica, como um quadro de Chirico ou o Pélléas de Debussy.
Mega Ferreira.
domingo, 15 de agosto de 2010
MÁRIO DIONÍSIO (1916- 1993)
A sua poesia foi-se progressivamente afastando do neo-realismo uma vez que o autor evoluiu com o tempo e as mudanças estéticas, políticas e sociais, muito embora se tenha afirmado sempre como opositor ao fascismo salazarista.
Publicou as obras poéticas Lamento na Hora Incerta, Poemas (1941), As Solicitações e Emboscadas (1950), Riso Dissonante (1950), Memória de um Pintor Desconhecido (1965), Le Feu Qui Dort (1967, obra a partir da qual a sua poética apresenta por vezes traços do surrealismo) e Terceira Idade (1982, Prémio do Centro Português da Associação Internacional de Críticos Literários, ex-aequo com uma obra de Alexandre O'Neill). Publicou ainda o volume de contos Dia Cinzento (1944) e os romances Não Há Morte nem Princípio (1969), Monólogo a Duas Vozes (1986) e A Morte é Para os Outros (1988). No domínio do ensaio e da polémica escreveu Ficha 14 (1944), Vincent Van Gogh (1947), XVI Desenhos de Júlio Pomar (1948), «Guilherme de Azevedo», in Perspectiva da Literatura Portuguesa do Século XIX (1949), Encontros em Paris (1951, entrevistas com personalidades várias), Conflito e Unidade da Arte Contemporânea (1958), A Paleta e o Mundo (2 volumes, 1956-1960) e Autobiografia (1987). Há ainda vários estudos e prefácios críticos de sua autoria, como os de Poemas Completos, de Manuel da Fonseca (1963), Casa na Duna, de Carlos de Oliveira (1963), Barranco de Cegos, de Alves Redol (1970), Poeta Militante I, de José Gomes Ferreira (1977), O Mundo dos Outros, de José Gomes Ferreira (1978), O Anjo Ancorado, de José Cardoso Pires (1985), Mensagem, de Fernando Pessoa (1985), e Júlio Pomar (1990)
*
Em surdina
Direis que não é poesia
Eu canto porque a voz nasce e tem de libertar-se.
.
O meu grito e meu canto é a voz de milhões.
.
Por isso que me importa?
.
Direis que não é poesia.
E a mim que importa
.
Eu sigo e seguirei
.
Direis que não é poesia
É andar, é andar!
CONSULTA: AQUI