JOÃO JOSÉ COCHOFEL (1919 - 1982)

Pintura de Mário Dionísio

Ânsia

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Há uma ave que rompe do teu corpo
e desaparece a voar.
Gaivota, andorinha, cotovia?
Veio beber e soltou-se.
Deixa uma ânsia latente
a estremecer no ar.

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Tarde

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Teus olhos húmidos eram lagos
em que nosso desejo se mirava.
Tua boca entre aberta
era a mensagem
do teu corpo moço que se dava.

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Teu hálito quente
embrulhado de desejo
vinha de não sei lá que profundezas
em que de amor tuas entranhas se abrasavam.
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E havia, amor, a envolver-nos,
essa solidão enorme
entre pinheiros, céu e terra quente
da tarde que dorme …

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Sensibilidade

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Que sensibilidade me sobe
da passada adolescência?
Que agudeza dos sentidos
me perturba a consciência?
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Surge do desencanto
um mundo a que me abandono.
Tranquilo e caricioso
como um sol de Outono.
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A cor, a luz, as formas,
sinto-as de coração novo!
Em tudo desconheço
uma experiência que renovo.
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Como quem sai
duma longa doença,
deslumbrado e comovido
pela convalescença.
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