O importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós mesmos fazemos do que os outros fizeram de nós.
JEAN-PAUL SARTRE

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

MAY SHELDON – RAINHA DO KILIMANJARO

Num retrato de 1891, May Sheldon, tem um ar de imperatriz. Veste um magnifico vestido comprido de seda branca, exageradamente espartilhado, coberto de pedrarias, e um cinto também de pedras preciosas junto ao qual leva uma espada ornamentada. O mais interessante na sua indumentária é a sua longa cabeleira loira.
Este era o uniforme de gala que a exploradora May Sheldon utilizava na sua expedição ao Quénia para impressionar os chefes masais. Aos guerreiros africanos anunciava a sua visita com foguetes e música. Os carregadores chamavam-lhe Bebé Bwana, mulher chefe, embora ela preferisse o título mais pomposo de Rainha Branca do Kilimanjaro. Excentricidades à parte, foi uma mulher que viveu à frente do seu tempo, feminina e magnífica comunicadora.
No século XIX, época de grandes explorações africanas, demonstrou que uma mulher também podia organizar uma expedição ao nível de Livingstone ou Stanley. A sua foi das mais originais e menos sangrentas do seu tempo.
O célebre explorador Stanley nunca imaginou que aquela jovem, filha do seu amigo, o coronel French, um dia seguiria os seus passos. A norte-americana, que nasceu em 1858 no seio de uma família sulista abastada e liberal, dedicou a sua juventude ao estudo dos idiomas e das ciências, atraída pelo mundo das explorações. Os seus pais eram cultos e cosmopolitas, além de serem grandes viajantes e com 16 anos acompanhou-os numa viagem à volta do mundo, como era moda entre a aristocracia.
May além de caçar e montar a cavalo, devorava livros de viagens e mapas de remotos países. Com 33 anos casou, mas sentia que tinha de fazer algo na vida de transcendente, que nenhuma mulher tivesse feito. Decidiu viajar sozinha até África, ao país dos masais e organizar a sua própria expedição. Preparou a sua viagem como uma operação militar e como mulher rica queria viajar com o maior conforto.
No seu livro, «De sultão a sultão, aventuras entre os masais e outras tribos da África Oriental, publicado em 1892, enumera a lista interminável da sua bagagem, tendas, espingardas, farmácia ambulante, mas também uma banheira de zinco, um serviço de porcelana, talheres de prata e todo um arsenal de roupa pessoal. Para moeda de troca com os nativos, leva guarda-chuvas, caixas de música, relógios e panos. Para não ser esquecida leva anéis de cobre com o seu nome gravado para oferecer aos africanos. O mais espectacular é um enorme palanquim de vimes entrançado com cortinas e almofadas, para seu transporte.
Em 1891, May Sheldon, despede-se do marido e parte de Nápoles, para Port Said, no Canal do Suez. Continua a viagem até Aden (Iémen) e meses mais tarde chega ao porto de Mombasa, na costa oriental africana. Começam os problemas para May, porque não há carregadores que queiram acompanhar uma mulher ao interior do continente. May não desiste e pede ajuda ao sultão de Zanzibar. Ao fim de várias cartas de recomendação consegue reunir 100 homens, apesar dos mesmos terem medo dos masais e não acreditarem que uma mulher os possa defender. Bebé Bwana, vai ganhando a confiança dos mesmos, preocupando-se e tratando-os das suas doenças e usando mesmo pistolas quando algum perigo os ameaça.
A viagem tornou-se muito penosa, nas páginas do seu livro cita os perigos encontrados: cobras, formigas venenosas, pragas de mosquitos, carraças e pulgas. May Sheldon todos os dias tem que passar revista aos homens e tratar das suas feridas. Ao fim do dia retira-se para a sua tenda, toma um banho de banheira, janta à luz das velas, come na sua louça de porcelana e anota no diário todos os incidentes. Após seis meses de uma esgotante caminhada, a exploradora encontrará os lendários masais ao norte de Kilimanjaro. Sobre eles escreve no seu diário: Estes esplêndidos selvagens lutam em silêncio e têm uma táctica, uma energia, uma audácia e uma intrepidez superior. São originais com os seus adornos, seu corpo tem harmonia e beleza». A arrogância daqueles homens cativaram-na da mesma forma como aconteceu a outras escritoras, entre elas Karen Blixen.
A tribo mais temida pela ferocidade dos seus guerreiros sofreu grandes mudanças depois de May Sheldon, foram convertidos à força em pastores nómadas e atracções turísticas. Não há dúvida que a sua imagem atravessando solitários a imensa savana africana é de uma beleza deslumbrante.
A expedição de May Sheldon durou pouco mais de um ano. Quando regressou a Inglaterra publicou o seu livro, já citado, que alcançou um enorme êxito. May tornou-se uma personagem popular da sociedade britânica e americana. Ela transmitia a sua viagem ao grande público com emoção e romantismo, uma experiência pela qual valia a pena morrer.

FONTE: Moratò, Cristina, «Viajeras Intrepidas y Aventureras» (ed. Plaza y Janés)

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